Aos 18 anos, Cine PE encerra mais uma edição e deixa a impressão de ter virado um ‘adolescente confuso’
por Talita Corrêa em 03-05-2014
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A maioridade chegou para o Cine PE com seu devido peso. Sua 18ª edição teve a cara de um festival que, perdido com a própria idade e identidade, quis se renovar. E se os contratempos pubescentes não são fáceis para ninguém, imagine para um evento que se diz carente de apoio, patrocínio e paternidade.
Em 2014, o Cine PE abriu, pela primeira vez, suas mostras competitivas para produções estrangeiras. No primeiro dia de festival, uma mostra cansativa de curtas pernambucanos trouxe outro ponto do seu novo formato, que ainda incluiu a diluição da cerimônia de premiação em duas (uma na terça-feira, 29, e uma ontem, sexta-feira, 2). Talvez ainda não seja possível afirmar quais mudanças foram exatamente responsáveis pelo afastamento do público, mas a verdade é que, neste ano, o Cine PE foi quase todo sinônimo de cadeiras gradativamente vazias.
A cerimônia de encerramento do festival, realizada na última noite, também amargou uma plateia ausente. Ao receber pela primeira vez o evento, o Teatro Isabel não lotou. Não foi só a chuva, aliás, que ajudou nesse malogro. O sumiço dos próprios premiados na hora em que eram chamados ao palco, tirou boa parte do brilho da festa, apresentada pela atriz Deborah Secco.
(Pedro Brício, Mini Kerti, Kiti Duarte, Leandro Assis)
O longa “Muitos homens num só”, de Mini Kerti, inspirado em personagens do cronista João do Rio, levou a maior parte das premiações – ao todo, dez troféus Calunga, incluindo os de melhor filme, direção, ator (Vladimir Brichta) e atriz (Alice Braga). O júri oficial ainda distribuiu menções honrosas para os também brasileiros “O menino no espelho”, de Guilherme Fiuza Zenha e para “O mundodeserto de almas negras”, de Ruy Veridiano.
Além da entrega dos prêmios, a noite teve duas homenagens póstumas: a José Wilker, morto mês passado e representado no palco por familiares, como a filha, Isabel Wilker, que, emocionadíssima, leu um texto do ator, e ao crítico de cinema baiano João Carlos Sampaio, que morreu na madrugada da sexta-feira, vítima de um enfarto fulminante, durante sua vinda a Recife para a cobertura do evento.
(Isabel Wilker e familiares de José Wilker)
“Perdemos uma grande referência. Aliás, perdemos não… Tenho certeza que o trabalho de José Wilker seguirá como inspiração para sempre. Um nordestino talentoso, adotado por Pernambuco e por todo Brasil. Querido, queridíssimo. É triste fazer para ele uma homenagem póstuma, mas ela merecia ser feita”, disse Déborah Secco.
O festival ainda mencionou os 50 anos do lançamento de “Deus e o diabo na terra do sol”, de Glauber Rocha, mas o tributo que não teve a presença de nenhum representante da família do baiano.
Em conversa com Estevão Soares, colunista do OF, Rubens Ewald Filho, jornalista, apresentador, crítico de cinema e curador dos festivais de Gramado e Paulínea, resumiu exatamente essa impressão de estranha exiguidade que o festival deixou:
“A minha sensação era de um festival que tinha perdido sua identidade, que estava procurando uma nova, acho eu, da maneira errada. Ou seja, colocar um filme americano como Grande Hotel Budapeste, não acho que seja solução, a não ser que fosse um épico que tivesse um link regional. O que ficou claro é que o público, fiel aos filmes brasileiros, não quer ver os filmes de arte estrangeiros. Acho que falta a presença de mais atores famosos brasileiros e falta recuperar a identidade do festival como um grande porta-voz do cinema nacional. Esperava uma celebração do cinema nacional e em especial regional, mas não vi muito isso”.
(Estevão Soares e Rubens Ewald Filho)
Premiados
Direção: Mini Kerti (“Muitos homens num só”)
Roteiro: Leandro Assis (“Muitos homens num só”)
Ator: Vladimir Brichta (“Muitos homens num só”)
Atriz: Alice Braga (“Muitos homens num só”)
Fotografia: Luis Abramo (“Romance policial”)
Montagem: Mirco Garrone (“Anni felici”)
Edição de Som: SÃĐrgio Mekler (“Muitos homens num só”)
Trilha sonora: Dado Villa Lobos (“Muitos homens num só”)
Direção de arte: Kiti Duarte (“Muitos homens num só”)
Ator coadjuvante: Victor Monteiro (“Romance policial”) e Pedro Brício (“Muitos homens num só”)
Atriz coadjuvante: Roxana Campos (“Romance policial”) e Pia Engleberth (“Anni felici”)
Prêmio da Crítica/Abracine: “E agora? Lembra-me”, de Joaquim Pinto
Júri popular: “Muitos homens num só”