“Abraço”, filme integrante da Mostra Competitiva de Longas-Metragens da 23ª edição do Cine PE, foi a produção escolhida para finalizar a noite de exibições desta terça-feira (30). Remontando uma mobilização que aconteceu em 2008, quando educadores sergipanos das redes municipal e estadual de ensino se uniram em defesa da manutenção da Progressão Vertical, para evitar a perda de direitos já conquistados, a película do diretor Deivisson Fiuza fala sobre resistência. Em um país politicamente rachado e trazendo para o Recife uma história que envolve educação, movimento estudantil, machismo, racismo e resiliência, a equipe do longa subiu ao palco do Cinema São Luiz com discursos de protesto contra o governo federal. “O Brasil não merece o momento que está vivendo”, disparou Fiuza. Ovacionado pelo público, que mais uma vez lotou a sala de projeção, o cineasta teve suas palavras completadas pela breve e potente fala do ator Flávio Bauraqui: “Podem até nos balançar, mas cair, não iremos”.
A noite de exibições, aliás, contou com discursos de cineastas, produtores e atores munidos de diversas críticas políticas. A carioca Rozzi Brasil, diretora do curta “#Procuram-se Mulheres”, disparou no texto de apresentação do seu documentário: “Eu acho muito emblemático que em um momento como esse, em que a Ancine é tão atacada, eu tenha conseguido sair do Rio de Janeiro e chegado em Pernambuco com esse filme. Parece um quebra-cabeças divino”. Dentro da programação, filmes como “Mulheres de Fogo”, de Vinicius Meireles, também trouxeram ao público uma provocação sobre o direito à qualidade de vida. “A terra tinha que ser como o sol, vento e chuva. Todos têm o direito”, diz uma das personagens do documentário. O curta acompanha o assentamento Chico Mendes III, onde habitam 55 famílias provenientes dos conflitos que ocorreram entre 2004 e 2008, nas áreas antigamente pertencentes ao Engenho São João.
Também foram exibidos o romântico curta pernambucano “Pisciano”, de Alexandre Pitanga, e “Carrero, o Áspero Amável”, da pernambucana Luci Alcântara. Mais um trabalho que é fruto da parceria entre a cineasta veterana do Cine PE (essa é a sua quarta participação no festival) e o jornalista e escritor Raimundo Carrero, o documentário discorre sobre a carreira literária do premiado autor de mais de duas dezenas de romances, seu método de criação, sua experiência como ator de teatro e de cinema, além de seu trabalho como dramaturgo e roteirista.
A 23ª edição do Cine PE chega ao seu terceiro dia de exibições nesta quarta-feira (31). Na programação estão os curtas “Quando a Chuva Vem?” e “Sobre Viver”, ambos na Mostra Competitiva de Curtas-Metragens Pernambucanos, e “Obeso Mórbido”, “Cor de Pele”, “É Difícil te Encontrar”, “A Pedra” e “Apneia” entre os curtas nacionais. O longa-metragem da noite é o carioca “Vidas Descartáveis”, de Alexandre Valenti e Alberto Graça. As entradas são gratuitas.
Ator está no Recife para participar do 23º Cine PE.
No Recife para o lançamento do seu novo filme, “Abraço”, de DF Fiuza, que concorre na Mostra Competitiva de Longas-Metragens do Cine PE, Flávio Bauraqui trouxe um discurso fervoroso de protesto contra o atual cenário político brasileiro. A respeito dos recentes ataques à Ancine pelo presidente do Brasil, Jair Bolsonaro, Flávio comentou que “é bom que eles provoquem”.
“Só é atacado quem oferece uma espécie de risco. O medo é o que provoca o ataque, então só estão nos atacando porque sabem que nós estamos aqui para elucidar. Eles querem o boi mandado, os que aceitam tudo. Nós não temos que aceitar, temos que questionar. Eles não vão acabar com a gente. E é bom que ataquem, porque é aquela coisa de que toda ação gera uma reação”, provocou Bauraqui.
Se na noite de exibições da última terça-feira (30) o clima já era de protesto, a coletiva de imprensa organizada pela produção do evento na manhã desta quarta (31) atiçou inúmeros debates. Também esteve em foco o curta-metragem carioca “#Procuram-se Mulheres”, de Rozzi Brasil. O documentário, que expõe a invisibilidade da mulher e o machismo no samba, acendeu diversas questões durante o bate-papo, inclusive sobre a presença feminina no audiovisual.
Curador da Mostra Competitiva de Longas-Metragens e de Curtas-Metragens Nacionais, e mediador das coletivas, Edu Fernandes comentou sobre o conforto de ter visto tantas produções realizadas por mulheres durante a seleção de filmes para o festival. “É uma coisa com que nós, enquanto curadores, nos preocupamos muito: inserir filmes de diretoras mulheres. Neste ano, nós não precisamos nos preocupar muito com isso, porque o material chegou em grande quantidade – o que significa que tem mais mulheres produzindo cinema, e isso é ótimo”.
“Em Fernando de Noronha, se um nativo quebra uma privada, ele não pode ir a um armazém e comprar outra, ele precisa fazer uma petição pra isso. Imagine como é o tratamento com as grávidas. Pensa-se muito na ilha, mas não se pensa no povo que está lá”, provocou Kátia Mesel em coletiva de imprensa do Cine PE, na manhã desta terça-feira (30), no Hotel Nobile Suítes. A cineasta pernambucana falava sobre seu novo curta-metragem, “Parto Sim!”, exibido na noite da última segunda-feira (29), na abertura da 23ª edição do festival. Baseado em fatos reais, “Parto Sim” desnuda a peregrinação das mulheres grávidas que residem no arquipélago de Fernando de Noronha e que, devido à falta de assistência médica adequada para o parto, são obrigadas a se deslocar para o Recife antes da 34ª semana de gestação.
Na programação, Kátia dividiu a noite com outra pernambucana: a cineasta Deby Brennand, diretora de “Frei Damião – O Santo do Nordeste”, documentário ovacionado durante a abertura do festival. Na coletiva, Deby revelou que fatos sobrenaturais aconteceram durante a filmagem de seu segundo longa-metragem. “Nós estávamos em fase de produção, mas ainda era um segredo até para a minha família. Ninguém sabia da existência do projeto. Sabe aquela coisa bem recifense, de alguém que conhece alguém e essa corrente de conhecidos uma hora se conecta a você? Foi exatamente assim que Otacílio Cartaxo teve um sonho com o Frei dizendo que queria as imagens feitas por ele no meu filme. Quando essa mensagem chegou até a gente e nós fomos parar pra vê-las, era exatamente o que a gente precisava”. De acordo com Deby, Otacílio e o também cineasta Machado Bitencourt fizeram inúmeras imagens caseiras do Frei Damião entre 1968 e 1972, para um documentário que nunca chegou a sair do papel.
O Cine PE segue nesta terça-feira (30) com a exibição dos curtas pernambucanos “Mulheres de Fogo” e “Pisciano”, além de Carrero, o Áspero Amável”, de Luci Alcântara e “Procuram-se mulheres”, documentário de Rozzi Brasil, ambos dentro da Mostra Competitiva de Curtas-Metragens Nacionais. Em seguida, o evento exibe o longa “Abraço”, com presença confirmada do ator Flávio Bauraqui. Neste ano, o Cine PE acontece no Cinema São Luiz e as entradas são gratuitas.
A programação dos seminários da 23ª edição do Cine PE foi pautada, em sua essência, pelo papel econômico da cultura, passando por suas relações com dois temas específicos e relevantes: a infraestrutura e a formação técnica para o audiovisual.
O economista Alfredo Bertini, ex-secretário nacional do Audiovisual e da Infraestrutura Cultural do Ministério da Cultura, comandou, na tarde desta terça-feira (30), a mesa de debate. Bertini é autor de “Economia da cultura: a indústria do entretenimento e o audiovisual no Brasil”, um dos primeiros e principais registros bibliográficos sobre o papel econômico da cultura, editado pela Saraiva em 2008.
Sua apresentação de hoje no Cine PE, assim como tem exposto em palestras pelo Brasil, serviu para mostrar a fragilidade pública e privada em tratar a cultura pelo viés econômico. “A generalização de uma postura antieconômica e antiempreendedora, que deriva da visão de grande parte da sociedade e até dos que produzem cultura, culmina hoje nesse estado de descrédito quanto ao papel econômico do setor. Sem informações confiáveis e sem o devido conhecimento da complexidade e extensão da cadeia produtiva da cultura, não há como dar a ela o protagonismo econômico que lhe cabe. Fazer a cultura acontecer não representa um exercício de mero diletantismo. É um ofício econômico, que mobiliza recursos, gera empregos e renda, algo capaz de contribuir efetivamente para o desenvolvimento econômico do país”, defendeu Bertini.
Apesar desse “contexto 3D” de desconhecimento, desinformação e desinteresse, que mostra a pouca evolução do que representa a “economia da cultura”, Bertini ainda crê que o momento de crise e questionamento que o setor atravessa pode ser um elemento de oportunidade de superação. Para ele, é preciso entender o novo ambiente econômico e político e daí se extrair um novo e desafiante caminho, no qual será necessário trilhar novas estratégias de sobrevivência setorial. “Enquanto ação plural de cada segmentação do setor, é preciso não só deixar de lado as ideias e convicções individuais (inclusive, as políticas) em prol do fortalecimento de cada negócio cultural. Num contexto liberal e de expressão nacionalista, por exemplo, é poder mostrar a relevância econômica do setor e como poderá contribuir o empreendedor cultural de origem nacional. Ou seja, por tais meios e com disposição em favor da interlocução e do diálogo, há como mostrar o papel efetivo de agente de desenvolvimento, assim como fazem outros setores da atividade econômica”, concluiu Bertini.
Jornalista que fez o cerimonial do festival por 22 anos foi homenageada na noite desta segunda-feira (29)
Durante 22 anos, fosse no Cinema São Luiz ou no Teatro Guararapes – lugares que receberam e recebem de portas abertas o Cine PE – a jornalista e cerimonialista Graça Araújo emprestou sua potente voz ao festival. “Graça era a cara do Cine PE. Não tem como pensar em um e não lembrar do outro”, descreve a diretora do evento, Sandra Bertini. Não à toa, Sandra decidiu oferecer a grande homenagem da 23ª edição do Cine PE à amiga, falecida em setembro de 2018.
Para a surpresa do público, na abertura do festival, o palco se iluminou com um holograma que trazia o rosto e a voz da jornalista. “Eu sempre estive com vocês nesses 22 anos, neste ano não poderia ser diferente”. A homenagem, ovacionada pelo público que lotou o Cinema São Luiz na noite desta segunda-feira (29), também foi recebida com muito choro por colegas de trabalho, amigos e familiares de Graça.
O vídeo-simulação foi seguido pela estreia da atriz Nínive Caldas como cerimonialista do evento. “A vida da Graça (a nossa, Araújo) é uma extensão da vida do Cine PE”, dizia um dos trechos mais tocantes do texto de homenagem de Sandra Bertini, lido com muita sensibilidade por Nínive. A homenagem se encerrou com um vídeo de memórias e a entrega do troféu Calunga de Ouro, a maior honraria do festival, entregue à irmã de Graça pela equipe que trabalhou nos bastidores com a jornalista durante os últimos 22 anos.
Na abertura da programação de seu 23º ano, o Cine PE exibiu os dois filmes da mostra Hors Concours: o curta “Parto Sim”, de Kátia Mesel, e o longa-metragem “Frei Damião – O Santo do Nordeste”, de Deby Brennand.
Baseado em fatos reais, a ficção “Parto Sim” retrata a delicada situação das grávidas de Fernando de Noronha, que precisam deixar suas casas até a 34ª semana de gestação e ir para o Recife, onde há oferta de assistência médica adequada. “Gravidez precoce, adoção e aborto são mencionados dentro do enredo, então este é um filme que incomoda”, comentou a cineasta Kátia Mesel.
Por fim, o evento contou com a estreia do longa-metragem “Frei Damião – O Santo do Nordeste”, documentário que desvenda, por meio de entrevistas com alguns descendentes de italianos, amigos, párocos e frades franciscanos que conviveram com Frei Damião, o homem por trás do mito religioso. “É um prazer estrear meu segundo longa dentro do Cine PE. Antes de sonhar em ser cineasta, eu já prestigiava o evento”, comentou Deby.
O Cine PE segue nesta terça-feira (30) com a exibição dos curtas pernambucanos “Mulheres de Fogo” e “Pisciano”, além de Carrero, o Áspero Amável”, de Luci Alcântara e “Procuram-se mulheres”, documentário de Rozzi Brasil, ambos dentro da Mostra Competitiva de Curtas-metragens Nacionais. Em seguida, o evento exibe o longa-metragem “Abraço”, com presença confirmada do ator Flávio Bauraqui. Neste ano, o Cine PE acontece no Cinema São Luiz e as entradas são gratuitas.